Como escolher genéticas: um pouco sobre sementes, strains e breeders

04/01/2021 8 minutos de leitura

Sem dúvidas um grande desafio para quem se interessa em cultivar maconha é ter acesso a sementes de qualidade. Embora qualquer semente viável seja suficiente para iniciar um cultivo não é qualquer semente que vai atender as necessidades e expectativas do cultivador. Começar a pesquisar sobre sementes de maconha é como entrar na toca do coelho de Alice no País das Maravilhas, de repente um universo completamente novo e peculiar que você não fazia ideia que existia aparece na sua frente. O objetivo desse texto é esclarecer alguns pontos fundamentais para deixar o leitor mais confortável na hora de escolher genéticas de maconha para seu cultivo.

Qual a importância da genética?

Se qualquer semente viável é suficiente para iniciar um cultivo, porque um cultivador deve se importar com a origem genética das suas sementes? A resposta é bem simples, tudo que a planta pode produzir esta em sua carga genética. Todas as possíveis características da futura planta estão registradas no código genético dentro da semente. Durante o ciclo de vida a interação da planta com o ambiente de cultivo vai possibilitar a expressão dessas características. Se o cultivador deseja plantas compactas que gerem flores arroxeadas com aroma de tangerina vai ter que cultivar uma variedade que carregue essas características em seu código genético.

Falar de genética parece algo cientifico demais mas fazendo uma analogia com cachorros fica bem simples. Qualquer um de nós entende que a espécie cachorro tem enorme variedade e que classificamos essa variedade em diferentes raças. Cada raça de cachorro tem um conjunto esperado de características, e assim sabemos o que esperar da futura aparência, do tamanho e do comportamento de um filhote de Rottweiler. É interessante para quem deseja criar cachorros saber as características da raça que vai criar, afinal pode ser difícil manter um Rottweiler numa quitinete ou frustrante ter um Pug para fazer guarda de um sítio.

Da mesma forma, maconha também tem enorme variedade genética e as diferentes ‘raças de maconha’ são chamadas de strains. Uma strain é uma variedade de maconha com características conhecidas e previsíveis, é importante o cultivador conhecer a strain que vai cultivar para saber se atende suas expectativas e necessidades. A strain Panama é conhecida por ser de grande porte, longa floração e efeito eufórico, pode ser frustrante para um cultivador que tem uma mini estufa, deseja colheitas frequentes e efeito relaxante para dormir.

Escolha strains que ofereçam o que você procura e sejam adequadas para sua realidade de cultivo. Se não tem nada em mente e esta aberto a experimentar, acompanhe canais especializados e relatos de outros cultivadores com objetivo de obter indicações de bons produtores. Bons produtores desenvolvem boas strains/genéticas.

Os tipos de sementes

As sementes de maconha frequentemente são oferecidas em três tipos:

  • sementes regulares: são as sementes normais e naturais obtidas através do cruzamento de uma planta fêmea com uma planta macho; produzem plantas com chances iguais de serem macho ou fêmea;
  • sementes “feminizadas”: são resultado do cruzamento de uma planta fêmea natural com uma planta fêmea quimicamente tratada para produzir pólen como um macho; produzem somente plantas fêmeas;
  • sementes “automáticas”: são resultado do cruzamento com uma linhagem específica de cannabis; produzem plantas que florescem ao atingir a maturidade independente do fotoperíodo; foram desenvolvidas para oferecer colheitas em outdoor nos meses de primavera e verão, quando o fotoperíodo não permite o florescimento de plantas regulares;

Quem é quem na criação de strains e produção de sementes

Novas strains de maconha são desenvolvidas através de cruzamento e seleção de plantas. As pessoas que se dedicam aos projetos de criação de novas strains são chamados de breeders (do inglês, criadores). Esses projetos requerem bastante tempo de desenvolvimento, frequentemente com seleções envolvendo até milhares de plantas e extensa lista de cultivadores testadores. Tudo isso é para garantir a seleção dos melhores indivíduos com as características desejadas para aquela strain. Depois desse longo período de trabalho o breeder sabe que ao cruzar o individuo fêmea #45 com o individuo macho #273 ele produz sementes que carregam as características genéticas desejadas. Feliz da vida ele batiza sua nova strain e passa a produzir sementes com as plantas selecionadas. Assim como entre as raças de cachorro a origem genética dos indivíduos é importante, breeders guardam a sete chaves as plantas matrizes, afinal só com elas é possível ter a exata genética que eles criaram.

Nem todo projeto de strain tem esse investimento de tempo, algumas strains são criadas em projetos mais rápidos e com menos estabilidade. Os criadores dessas strains são chamados de pollen chuckers, algo como lançadores de pólen. O termo de conotação inicialmente pejorativa quer dizer que esses criadores apenas ‘cruzam plantas jogando pólen’ e não trabalham na busca de características e estabilização delas. O que soa negativo para uns é positivo para outros. Pollen chuckers geralmente apostam na utilização de boas strains de bons breeders como base para seus projetos. Os interessados em suas criações realmente querem a variedade genética dessas misturas.

Um participante “oculto” desse ecossistema é responsável apenas gerar sementes em larga escala. Esse “criador” gera lotes de sementes “cópias” das strains de breeders famosos, as sementes geradas dessa maneira são chamadas de bulk seeds e tem má reputação devido a baixa qualidade e fidelidade. Produtores de bulk seed geralmente trabalham ocultos para terceiros e suas sementes são uma parcela significativa do mercado.

Por fim, essas sementes produzidas geralmente são vendidas ao cultivador através de bancos de sementes. Em inglês seedbank, nada mais é do que uma loja especializada que vende sementes de diferentes origens. Acredito que a separação entre quem produzia e quem vendia era responsável por garantir alguma segurança num passado de ilegalidade. Atualmente é mais comum vermos produtores vendendo direto ao público.

Separando o joio do trigo

A oferta de strains e sementes é virtualmente infinita, na prática pode ser bem difícil identificar cada um desses atores então seguem algumas dicas que podem ajudar. Começando pela parte boa, vamos falar dos bons breeders e pollen chuckers:

  • bons breeders: detalham de maneira orgulhosa a linhagem das plantas utilizadas em seus projetos; gostam de descrever as características de suas strains e costumam garantir que todas sementes gerem indivíduos fiéis a essas características; tem ritmo de trabalho mais lento, fazem menos lançamentos; geralmente tem programas de testadores públicos; exibem seleções de plantas; exibem plantas macho; suas strains frequentemente são utilizadas por outros breeders para novos projetos;
  • bons pollen chuckers: utilizam strains de bons breeders como base; frequentemente associados a bons breeders; transparentes em respeito ao nível de estabilidade/maturidade das strains; exibem seleções de plantas; exibem plantas macho;

Os produtores de bulkseeds ficam ocultos e suas sementes são utilizadas basicamente por breeders terceirizando produção ou falsos breeders. Marcas que se posicionam como breeders mas na verdade apenas vendem sementes de outros em suas embalagens. Algumas dicas pra identificar cada tipo:

  • breeder terceirizando: foco nas vendas em larga escala de strains próprias já famosas; não lança mais novidades; declínio da ênfase em linhagem; relatos de queda de qualidade das sementes; boatos sobre a perda de matrizes;

  • falso breeder: catálogo sem criações próprias, somente versões baratas ou automáticas de strains famosas de outros breeders; pouca ou nenhuma ênfase na linhagem das plantas; somente fotos de catálogo; não exibem seleções de plantas; não exibem plantas macho; bastante apelo visual e marketing;

  • falso breeder whitelabel: catálogo com “criações próprias” mas de linhagens desconhecidas; pouca ou nenhuma ênfase na linhagem das plantas; somente fotos de catálogo; não exibem seleções de plantas; não exibem plantas macho; bastante apelo visual e marketing;

Escolhendo e comprando

Com tudo que vimos até aqui todo esse universo de sementes de maconha já não é mais tão assustador como era antes. Recomendo que o cultivador passe a acompanhar o trabalho de breeders ou pollen chuckers que lhe despertem interesse. Procure nos relatos não só do produtor mas principalmente de outros cultivadores quais strains tem características desejadas e são adequadas para seu cultivo. Identifique em quais seedbanks o produtor disponibiliza suas strains e entre em contato com o que for mais conveniente para compra das sementes.

As sementes podem custar muito caro ainda mais em situação de mercado ilegal. Um simples cruzamento entre duas plantas é capaz de gerar milhares de sementes, logo o valor delas como produto é bem baixo, você deve pagar por boa carga genética. Uma semente com boa genética tem muito mais valor do que dezenas de sementes “sem pedigree”. Invista em sementes regulares, elas tem naturalmente mais vigor e permitem que o cultivador produza suas próprias sementes e até mesmo crie novas strains.

Pra acabar!

Espero que com esse texto você passe a ficar mais a vontade para conscientemente escolher em quais strains e produtores investir o seu dinheiro.

Glossário

  • strain: ‘cepa, estirpe’, uma variedade de maconha com características conhecidas e previsíveis.
  • breeder: ‘criador’, indivíduo que trabalha anos selecionando e isolando características desejadas para criar novas strains.
  • polen chucker: ‘lançador de pólen’, termo inicialmente pejorativo para falar sobre criadores de sementes que não se dedicam a seleção e estabilidade.
  • bulk seed: ‘semente a granel’, sementes produzidas em larga escala sem controle de qualidade e fidelidade.
  • seed bank: ‘banco de sementes’, lojas que vendem sementes de diferentes breeders diretamente para os consumidores finais.
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@matinhocheiroso